sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

DIREITO ECONÔMICO: A CIÊNCIA VISTA COMO UMA VELA EM MEIO A ESCURIDÃO PARA O CLAREAR DO DESENVOLVIMENTO, TECNOLOGIA, INOVAÇÃO E ESPERANÇA





Faça do direito uma ciência e não um amontoado de frases obsolescentes

O direito mudou - se tratando de uma ciência de construto social, que parte do pressuposto aristotélico de homem como um animal político, a sociedade impulsiona a mudança jurídica conforme suas demandas e projeções - contudo as questões que surgem a baila residem no aspecto estrutural do direito: o que mudou? Qual é a sua nova configuração? Para onde podemos ir com esse novo direito?

A mudança ocorreu devido a demanda do próprio sistema capitalista para uma nova configuração social: em profundidade o direito permanece o mesmo (pilar que sustenta o sistema capitalista), contudo em aparência ele sofreu uma mudança copernicana, haja vista a formalidade que proporcionava suporte às teses jurídicas ter dado lugar à dinâmica, fluidez e interdisciplinaridade que hoje calça a nova forma de versar e fazer o direito. Nesse sentido, o direito deste início de século XXI deixa de lado o formalismo dos séculos passados para agir no meio social através da tecnologia, inovação e interdisciplinaridade. Não se pode dizer que o formalismo do direito de nada serve em face a conjuntura global, afinal, a linguagem produz sentido às reflexões, conceitos e condutas prescritivas do universo social, todavia é o mercado financeiro que influência diretamente as políticas de governança que darão forma ao direito posto pelo Estado à sociedade.

Isso posto, vem a lume uma questão de fundamental importância: como o operador do direito pode trabalhar neste cenário tão aberto? Primeiramente devemos nos ater que tamanha abertura se faz pelo excesso de informações que esta nova configuração global nos trás, contudo só há uma maneira de lidar com a gama de dados em expansão  - um bom exemplo para dar forma a esta primeira reflexão seria o ato de realizar uma pesquisa no Google; vejamos:  quando o pesquisador digita o seu tema no site de pesquisa, ele é remetido de forma automática a um turbilhão de sites que versam sobre o tema que está sendo pesquisado ou a sites que possuem assuntos similares, mas que não servirão de valia alguma ao pesquisador; o bom pesquisador ira filtrar essa gama de informações para então começar a realizar a sua pesquisa, optando entrar em sites confiáveis e que exponham o tema em questão através de um método pautado pela tradição construída entre a simbologia, a lógica e a linguagem - esse meio é o conhecimento racional, limpo de doxa, e cheio de episteme, ou seja, o conhecimento fundado pela analise cética que apenas as ferramentas disponibilizadas pela ciência podem oferecer ao individuo cheio de gana para compreender a sociedade em que esta inserido. Nesse sentido vem a tona a articulação cientifica em contraposição a desigualdade e ao totalitarismo.

     A ciência se mostra como uma vela em meio a escuridão, possuindo o poder de inovar, desenvolver e proporcionar esperança a sociedade através da tecnologia produzida a uma fidelidade aos fatos concretos; nesse campo de atuação o direito tem primordial importância, haja vista ser a lógica jurídica em dialogo com a economia o motor que pode proporcionar o alçar voo social através de seu desenvolvimento proporcionado pela criação de politicas publicas.

O astrônomo e biólogo Carl Sagan já nos alertava para os riscos da má aplicação de politicas publicas que expurguem qualquer intento de ordem cientifica ao meio social, nos orientando a fomentar a ciência em função do bem coletivo, para através dela, desenvolver a sociedade com o intuito de combater o totalitarismo, zelar pela democracia e alteridade. É nessa toada que devemos hastear a nossa bandeira em prol da proteção da chama que nutre a vela cientifica e, por tanto, manter aceso o farol aos tripulantes das embarcações que navegam pelos mares do excesso de informação em meio a um mundo que clama pelo expurgo das desigualdades, pois a ciência do direito deve ir em busca da analise concreta: não há verdades universais, pois devemos nos atentar para a coerente percepção de cada nota social que nos é exposta a lume, para através delas encontrarmos a harmonia entre os mundos.

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

ALGUMAS PONDERAÇÕES A RESPEITO DO IPI – PARTE I



Nas palavras do professor Paulo de Barros Carvalho,

o imposto sobre produtos industrializados é a expressão mais singela da iniciativa diretora da política econômica pelo Estado brasileiro.”

Diante disso, as características que delimitam a hipótese de incidência deste tributo se fazem, primeiramente, através do conceito determinante para a identificação do aspecto material do imposto em foco: produto industrializado. Por isso o parágrafo único do Art. 46, CTN, o define como o “que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo”.

 Corroborando essa posição, aduz o doutor Sacha Calmon Navarro Coêlho:

O conceito de produtos industrializados mantém-se idêntico, isto é, abrangente, nos termos em que já sedimentado nas leis, regulamentos e jurisprudência do país. Constitui industrialização toda operação física, química, mecânica ou técnica que modifique a natureza da “coisa” ou a sua finalidade, ou que a aperfeiçoe para o consumo.”

Quanto ao aspecto espacial, genericamente, definimos como o território nacional. Especificamente, há que se atentar para as três materialidades: a) repartição aduaneira; b) estabelecimento industrial; e c) local da arrematação. Atos de fundamentação geográfica.

Outrossim, o aspecto temporal, por sua vez, também leva em consideração as três incidências: a) momento do desembaraço aduaneiro; b) saída do estabelecimento; e c) momento da arrematação. Atos de fundamentação volitiva.

Ainda quanto ao aspecto temporal, teremos a saída do produto do estabelecimento industrial: diante deste diapasão, há a apresentação da obviedade de que a “saída” não é meramente física, pois há que se concordar em sede de negócio jurídico a implicação da transferência de titularidade sobre o bem, demonstrando que a abstração possui caráter concreto ao se solidificar através da linguagem, estabelecendo uma realidade logica emanada do fato concreto.

No aspecto pessoal, temse a União como sujeito ativo e, como sujeitos passivos, aqueles declarados no Art. 51, CTN: o importador, o industrial, o comerciante fornecedor e o arrematante. O parágrafo único desse dispositivo esclarece que, para efeitos desse imposto, considerase contribuinte autônomo qualquer estabelecimento de importador, industrial, comerciante ou arrematante.

No que se refere ao aspecto quantitativo, as bases de cálculo veem indicadas no Art. 47, CTN, de acordo com as materialidades indicadas: o preço normal, o valor da operação ou o preço da arrematação, respectivamente.

A alíquota aplicável, consistirá, em regra, num percentual a incidir sobre a base de cálculo. Repitase que o imposto em foco tem suas alíquotas passiveis de alteração pelo Poder Executivo, atendidas as condições e limites estabelecidos em lei (Art. 153, § 1o, CR), bem como será́ seletivo, em função da essencialidade do produto (Arts. 153, § 3o, I, CR, e 48, CTN).

Atualmente, a Tabela do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI (Decreto n. 6.006, de 2006) contempla alíquotas que variam de 0 (a alíquota mais frequente) a 330% (cigarros contendo tabaco), sendo que a maioria delas situase abaixo dos 20%. A diferenciação de alíquotas prevista na TIPI pode suscitar discussão acerca do efetivo cumprimento da regra da seletividade, se a alíquota correspondente a um produto necessário revelarse mais elevada do que aquela aplicável a um produto considerado supérfluo.

Posto isso, convém notar a preocupação do Estado de Direito em utilizar o IPI, através da instrumentalidade tributária, para tornar a sociedade um lugar aplainado com a ideia de bem comum presente na Constituição da Republica de 1988; esse comportamento não deve ser visto como atitude totalitária de controle/engenharia social, haja vista a norma tributária incidir, de maneira, mais pesada em produtos que tem como fundamento a depredação do indivíduo em coletividade.

segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

IMPOSTO E TAXA: NÃO HÁ PARADOXOS PARA A TRIBUTAÇÃO!





Historicamente, o tributo surge como uma oferenda, uma homenagem ao chefe da comunidade ou guerreiro da tribo que merece destaque: as pessoas pagavam tributos em função da eventual proteção que recebiam.

Diante disto, convém trazer à baila, através da boa definição que a linguagem jurídica nos induz a construir, que o termo tributo, advém do latim tribus (da tribo), tributum e tributus, expressa, dentre outros significados, “aquilo que se concede ou que se sofre, por razões morais, dever, necessidade etc.”; “ato público como demonstração de admiração e respeito por alguém, homenagem”; e “tributo, imposto, contribuição”: nesse viés simbólico o conceito, tributo, expressa um ato volitivo de entrega e recebimento; entrega de quem sente em seu amago a necessidade ou obrigação de “homenagear/prestar-reconhecimento/demonstrar-comprometimento-com-a-tradição” à pessoa ou ente que carrega, ontologicamente, a carga simbólica detentora de uma ordenança que amansa o espirito.

O surgimento do tributo se confunde com o da sociedade organizada, porquanto é registrado a sua existência desde os primórdios da História da humanidade: Egito e povos  do Oriente.

Originalmente, os tributos não constituíam exigências de caráter permanente, mas eram instituídos com o intuito de gerar arrecadação para financiar determinados propósitos, especialmente as guerras.

A partir do surgimento de uma formação política mais complexa, surge também a obrigatoriedade do tributo: se começa a cobrar das pessoas os impostos, sendo estes um tributo não vinculado com a atuação do Estado, conforme alude o professor Roque Antonio Carraza, em definição basilar para esta espécie tributária

“imposto é uma modalidade de tributo que tem por hipótese de incidência um fato qualquer, não consistente numa atuação estatal.”

E continua o mestre

“Deveras, o imposto encontra seu fundamento de validade, apenas, na competência tributária da pessoa politica, não havendo necessidade, para que ele seja instituído e cobrado, de que o Poder Publico desenvolva, em relação ao contribuinte, qualquer atividade especifica”.

Desta maneira se infere ser o imposto um tributo que produz, em sua natureza jurídica, um comando, linguisticamente estruturado, obrigacional, no que diz respeito a uma condição ao Estado de Direito cumprir: não há o que se falar em cenário finalístico para a arrecadação de IPTU, IPVA, ITR, et caterva. Cabe ao Estado de Direito reverter a receita arrecadada, através da fiscalização dos impostos, em um planejamento consciente às diretrizes dispostas no panorama orçamentário do ano vigente: tal geografia financeira se dá através da lei orçamentaria, devidamente construída pelo Poder Executivo e aprovada pelo Poder Legislativo (seja da Federação, nos Estados Federados, do Município ou Distrito Federal);  as disposições referentes aos investimentos do Estado pelo Governo se dará na lei orçamentaria do ano vigente.

O preço da modernidade é, impreterivelmente, a trágica confiança que o indivíduo deve depositar na estrutura lógica construída para ordenar a conjuntura social.

Outro tributo que surge na sociedade organizada são as taxas, que ao contrário dos impostos, são tributos vinculados com a atuação do Estado (surgem com a  prestação de serviço público por parte do Estado: a taxa é cobrada em duas situações, a primeira se configura em específicas e divisíveis. Ex. cópia autenticada pelo cartório do tribunal de justiça).

Mas o que significa ser específico e divisível?

Especifico: serviço público especifico é aquele que consiste em atividade estatal fruível (fazer uso) individualmente por cada um de seus usuários. É o caso, dentre outros, dos serviços de fornecimento de água tratada e de energia elétrica. Carrega a contraposição ao serviço público geral ou genérico, no qual os administrados fruem coletivamente da atividade estatal, tais como a segurança e a iluminação pública.

Divisível: O serviço público divisível, por sua vez, é aquele que, sendo especifico, possibilita a mensuração dessa fruição (fazer uso) individual. Se inviável tal mensuração, descabida a exigência de taxa.

O segundo tipo de possibilidade de cobrança de taxa é em razão do exercício efetivo ou potencial do poder de polícia, ou seja, é a fiscalização. Ex. operação carne fraca.

Diante desta análise, se deve levar em conta a boa escrita do professor Paulo de Barros Carvalho a respeita da taxa:

O direito positivo vigente prevê duas espécies de taxas: a) taxas cobradas pela prestação de serviços públicos; e b) taxas exigidas em razão do excercicio do poder de polícia. Na redação dada pelo artigo 145, inciso II, da Constituição, podem ser instituídas “taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou posta à disposição”.

A civilização ocidental construiu as noções basilares que hoje dão forma as ferramentas que atingem os cidadãos, em seu cotidiano, proporcionando uma condição de dependência do indivíduo ao coletivo, contudo, esta ligação direta, nas quadras do século XXI, ganha escopo de necessidade, ao ponto de não sabermos projetar um cenário onde o Estado de Direito e a tributação inexistam: condição que nos remete a imagem de Jano, pois enquanto uma das faces olha à tristeza de um cenário doloroso, a outra face nos remete à felicidade e consolação de um cenário deleitoso. O preço da maturidade civilizacional está presente, agora nos cabe administra-lo com consciência cientifica: a dualidade da vida, bem como da civilização demonstra que a perfeição não existe, todavia é possível pleitear melhorias estruturais. 



sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

FISCALIDADE E EXTRAFISCALIDADE: APONTAMENTOS SUMULARES



Dentre as múltiplas incumbências a cargo do Estado de Direito está a tributação, que consiste, singelamente, na atividade estatal em arrecadar e fiscalizar - constituem competências administrativas e, portanto, passíveis de delegação a pessoas de direito público ou privado.

Outrossim, as relações de direito público, gênero no qual se inserem as relações tributárias, apresentam, como traço marcante, a bipolaridade, a significar que nelas estão presentes dois valores em constante tensão: de um lado, a autoridade do Poder Público; de outro, a Liberdade Individual. 

Dito isto, podemos auferir que o tributo atinge, obrigatoriamente, dois direitos fundamentais do homem: o direito à propriedade e o direito de liberdade.  

O DIREITO À PROPRIEDADE PRIVADA é alcançado direta e imediatamente pela tributação, porque o tributo consiste em prestação pecuniária compulsória, devida por força de lei, implicando a sua satisfação, necessariamente, a redução do patrimônio do sujeito passivo. TAL REDUÇÃO PATRIMONIAL, NÃO PODE CONFIGURAR CONFISCO (art. 150, IV, CR)  

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: 
IV - utilizar tributo com efeito de confisco 

        Mister trazer a baila que por imposto confiscatório (CONFISCO) devemos entender  ser aquele que absorve grande parte do valor da propriedade ou da renda do contribuinte. Desta maneira, o confisco se caracteriza quando a alíquota efetiva, sobre uma operação, resulte em mais de 50% sobre o valor econômico líquido (preço menos tributos).

Isso posto, é nesse momento que encontramos a noção de FISCALIDADE, ou seja, é o emprego de instrumentos tributários com finalidades meramente arrecadatórias sem consideração a outros objetivos.  

Ao passo que o DIREITO À LIBERDADE, será alcançado pelo tributo de maneira indireta, ou seja, conforme os objetivos a serem perseguidos, influenciando o comportamento e as decisões dos contribuintes. É desta maneira que ocorre a EXTRAFISCALIDADE. 

Esses dois movimentos de utilização da instrumentalidade tributária pelo Estado de Direito estão presentes no cotidiano de todas as pessoas da sociedade, por isso, devemos ter a consciência de jamais olvidar em possuir um cunho critico sobre os movimentos do governo, pois será ele que ditará os procedimentos que produzirão o compasso a ser executado pelo fisco.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

A FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO TRIBUTÁRIO



Caro leitor, o vídeo, abaixo, explica, de maneira didática, o que vem a ser a FUNÇÃO SOCIAL DO DIREITO TRIBUTÁRIO. Procuramos proporcionar uma entonação explicativa, sem nuances epistemológicas ou entranhada pelo excesso da instrumentalidade jurídica, para que você possa de maneira clara, honesta e franca, compreender, com a maior praticidade possível, o tema versado. Esperamos levar o bom entendimento do Direito Tributário, sem, jamais, esquecer de sua, devida, profundidade.  

Após o vídeo, se faz presente uma citação doutrinaria que o contextualiza através do caráter reflexivo, não se fazendo expurgar qualquer reflexo da tradição jurídica e postulado cientifico. 




"A tributação, no Estado de Direito Democrático, constitui instrumento da sociedade. É através das receitas tributárias que são viabilizadas a manutenção da estrutura política e administrativa do Estado e as ações de governo. Mas a tributação arbitrária ou excessiva pode, por si própria, ter efeitos perversos. Assim, a Constituição também cuida de definir as possibilidades e limites da tributação, fazendo-o através da outorga constitucional da competência tributária (quando a Constituição diz quais os tributos que podem ser instituídos e sob que forma, diz, também, implicitamente, que o que dali desborda não pode ser feito) e da clara enunciação de garantias fundamentais do contribuinte. A tributação é válida quando exercida na forma e medida admitidas pela Constituição Federal. A tributação que não encontra suporte no texto constitucional não constitui propriamente tributação, mas violência aos direitos individuais, arbítrio inconstitucional e ilegítimo." (PAULSEN, Leandro. Direito Tribuário: Constituição e Código Tributário à luz a doutrina e da jurisprudência. Editora Livraria do Advogado. Porto Alegre - RS. Ano. 2014. Pág. 42). 





sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

A IMUNIDADE COMO MANTENEDORA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS



Os direitos e garantias fundamentais estão positivadas na Constituição Federativa do Brasil, no título 2, dispostas no artigo 5º ao 17: devem ser considerados instrumentos jurídicos para a proteção do indivíduo frente a coação estatal. Contudo devemos esclarecer que está instrumentalidade protetiva não se vale de escudo para o Estado de Direito, pois este é constituído justamente para alicerçar o indivíduo em face de suas necessidades, fomentando a ordem em meio ao caos do mundo fático. Isso posto, o caráter protetivo dos direitos fundamentais assegura que nenhum governo[1] tirânico venha a engendrar nas estruturas do Estado a função de solapar as liberdades públicas, desta forma o confronto não será com o Estado de Direito, mas com o Estado corrompido pelos interesses de um príncipe sem virtú.

Em conformidade com o versado e a título de exposição, se ilustra, abaixo, o quadro evolutivo das gerações de direitos fundamentais:


Primeira geração

São os direitos civis e políticos

Segunda geração

Referem-se aos direitos de igualdade

Terceira geração

Aludem aos direitos de solidariedade

Quarta geração

Inferem aos direitos relacionados à pluralidade social

Assim, se deve trazer a exposição serem os direitos fundamentais fruto de um movimento dialético, historicamente produzido pela confluência das intencionalidades do ser humano materializados em movimentos sociais, bem como superação doutrinária por elevação dogmática de cunho humanístico, nesse sentido podemos colocar como exemplos, conforme mencionado pelo constitucionalista José Afonso da Silva, “o Manifesto do Partido Comunista e as doutrinas marxistas com sua crítica ao capitalismo burguês e a doutrina social da igreja, a partir do Papa Leão XIII, que teve especialmente o sentido de fundamentar uma ordem mais justa”[2]: essa evolução de itinerário fez com que a Igreja Católica Apostólica Romana se aproximasse dos pobres, corroborando para que a realidade jurídica abraçasse as classes abastadas e , por conseguinte, expandisse esse acolhimento para toda a sociedade:

“a expressão direitos fundamentais do homem são situações jurídicas, objetivas e subjetivas, definidas no direito positivo, em prol da dignidade, igualdade e liberdade da pessoa humana. Desde que, no plano interno, assumiram o caráter concreto de normas positivas constitucionais, não tem cabimento retomar a velha disputa sobre seu valor jurídico, que sua previsão em declaração ou em preâmbulos das constituições francesas suscita. Sua natureza passará a ser constitucional, o que já era uma posição expressa no art. 16 de Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, a ponto de, segundo este, sua adoção ser um dos elementos essenciais do próprio conceito de constituição.”[3]


Desta maneira, nos referimos a imunidade como uma forma utilizada pelo próprio Estado com a finalidade de proteger os direitos fundamentais que residem nas liberdades públicas em prol dos cidadãos. Eis a derradeira missão do Estado construído pela modernidade: promover a proteção do bem comum através da tecnologia da linguagem posta pelo direito, e, portanto, não olvidar que o fomento da tributação está intimamente associado com a legitimidade estatal através do zelo pelos direitos fundamentais.

Visto, a professora Regina Helena Costa expõe que as imunidades possuem o condão de aplicar, bem como aprofundar o “princípio da não-obstância do exercício de direitos fundamentais por via da tributação”[4], sendo consideradas normas que detém comando direto e imediato, devido a sua adjetivação como cláusulas pétreas. Diante disso, se deve trazer a lume, as imunidades, pertencerem aos direitos fundamentais de primeira geração, haja vista agirem em conformidade com a  não permissão para a imposição obrigacional do Estado ao sujeito de direito[5]. Em sede de exemplificação, podemos citar o Art. 5º, incisos IV, VI, e IX, da Constituição Federal (ambos zelam pela liberdade de pensamento, consciência e religião), bem como o Art. 150, inciso VI, alínea, b e d da Constituição Federal (assegura a liberdade religiosa, bem como a livre circulação de ideais através da imunização de templos e instituições religiosas e jornais, periódicos, bem como o papel destinado à sua impressão).

Em consonância com o exposto convém a lição da professora Regina Helena Costa:

“Em conclusão, verifica-se que as imunidades tributárias, além de densificarem princípios e valores constitucionais, conferindo a determinados sujeitos autêntico direito público subjetivo de não-sujeição à imposição fiscal, revelam-se, também, instrumentos de proteção de outros direitos fundamentais.”[6]

Ademais, é nessa toada que se visualiza a compilação dos valores sociais em benefício da ratio, ou seja, da razão humana cuja qual é autora de uma realidade onde o permitir ou o proibir que algo aconteça, deve ser trabalhado com profunda dinâmica, originando um cenário onde o equilíbrio deve preponderar sobre qualquer intento de exacerbação: é aqui que reside o ponto médio aristotélico.


[1] Segundo Norberto Bobbio, no livro “estado, governo e sociedade”, a principal distinção entre a concepção de Estado para a concepção de Governo, é que o primeiro simboliza a população que o originou, já o segundo será um grupo de pessoas que irá administrar as engrenagens estatais, para o bem, ou para o mal da sociedade.
[2] AFONSO DA SILVA, José. Curso de direito constitucional positivo. 37ª Edição. Editora Malheiros. São Paulo. 2013. Pág. 177.
[3] Ibidem. Pág. 181.
[4] COSTA, Regina Helena. Imunidades tributárias: teoria e análise da jurisprudência do STF. 3ª Edição. Editora Malheiros. São Paulo. 2015. Pág. 90 e 91
[5] Segundo o civilista, Carlos Alberto Bittar, em seu livro “teoria geral do direito civil”, compreende-se como sujeito de direito aqueles que “nas relações jurídicas os entes a que o direito reconhece personalidade, a saber, as pessoas naturais, (seres humanos) e as pessoas jurídicas (agrupamentos humanos personalizados), observadas as respectivas limitações. É que a ordem jurídica define os contornos em que se pode ter um direito e depois exercê-lo, sempre em função dos valores amparados em seu contexto. BITTAR, Carlos Alberto Bittar. Teoria geral do direito civil. 2ª Edição. Editora Forense Universitária. 2007. Pág. 90.
[6] Ibidem. Pág. 91

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

A RELEVÂNCIA DOS VALORES PARA A CONCEPÇÃO DA NORMA TRIBUTÁRIA



Parte II - A inserção dos valores na teoria da norma tributária

Para o Estado de Direito sobreviver, se faz necessário manter suas engrenagens polidas, ou seja, só se poderá perdurar no tempo histórico se houver uma atividade financeira coerente com uma relação balanceada entre a sua receita[1] e despesa[2], pois sem esse equilíbrio, o Estado se degringola, e, por derradeiro, sucumbe ao seu próprio peso e poder. 

Destarte, é imprescindível um sistema de arrecadação, neste momento o indivíduo haverá de ser compelido para sustentar a atividade do Estado, juntamente com toda a realidade que fora criada para a sua manutenção: a relação jurídica que é estabelecida se concretiza, de modo materialmente pulsante, na seara do direito tributário, pois será nesta ramificação da realidade jurídica que notamos, não apenas o coação estatal se movimentar, mas, principalmente, a dialética preponderante entre as liberdades individuais e o interesse público: os dois polos se movimentam conjuntamente como se estivessem em uma valsa, onde a harmonia entre o masculino e feminino deve estabelecer uma íntima confluência de desejos, sem olvidar da formalidade que gerencia cada movimento, zelando para que não ocorra qualquer espécie de sobreposição entre uma formalidade e outra, o que ocasionaria o descompasso e consequente ruína do espetáculo. Mister expor os ensinamentos do jurista, Rubens Gomes de Souza[3], contextualizando e aprofundando o aqui versado:

“Justamente quando o Estado começa a exercer essas atividades é que surgem situações de relação jurídica, isto é, situações de contacto ou conflito entre o Estado e os particulares, de cujo patrimônio aquele visa retirar o montante dos tributos. Sendo essas relações reguladas pelo direito, uma vez que o Estado moderno, tendo deixado de ser autocrático, só pode agir através do direito, formou-se, dentro do direito financeiro, um capítulo especial dedicado às regras jurídicas que disciplinam a criação, o desenvolvimento e a extinção de tais relações referentes à cobrança dos tributos e à sua fiscalização. Esse capítulo do direito financeiro, em razão da complexidade da matéria e da sua constante ampliação e especialização, adquiriu aos poucos uma situação de autonomia e constitui atualmente um ramo particular do direito público, denominado direito tributário. Podemos portanto definir o direito tributário como sendo o ramo do direito público que rege as relações jurídicas entre o Estado e os particulares, decorrentes da atividade financeira do Estado no que se refere à obtenção de receitas que correspondem ao conceito de tributos.”[4]

Diante deste cenário, estabelecido pela linguagem, o Direito Tributário será construído com o surgimento da norma tributária, pois ela produzirá o comando que dará origem à obrigação tributária que produzirá, na esfera do dever-ser, uma relação jurídica entre o fisco e o contribuinte. Para que a norma ganhe sentido, e, portanto, possa produzir o comando a ser obedecido, ela deve estar eivada pela valoração cultural que possibilitou sentido a este momento histórico. Essa valoração se dará por diversos níveis: econômico, antropológico, psicológico, histórico, político. Todavia, a valoração só inundará a realidade jurídica, com a sua axiologia, quando o poder constituinte, através de seus representantes, devidamente institucionalizados, verbalizar a linguagem abstrata à linguagem de comando, nesse instante a norma é criada, podendo ocasionar efeitos materiais às condutas dos indivíduos que sofrerão a incidência tributária e, consequentemente, recolherão o tributo em prol do Estado de Direito.

Por isso o direito tributário pode ser classificado como uma seara de extremada concretude, pois será nele que poderemos vislumbrar a realidade jurídica se materializar em ações de comando, conduta e responsabilidade.

Em conformidade os ensinamentos do professor Paulo de Barros Carvalho, não se deve, em hipótese alguma, olvidar ser a norma condicionada com a expressão existencial humana formalizada pela cultura, pois sem este aspecto a norma não possuirá eficácia e será fadada à inexistência para a realidade jurídica.

Ao se admitir que uma obrigação do direito surge no momento em que acontece certa manifestação jurídica na vida social, admite-se, por conseguinte, que o direito funciona com a sua lógica própria. Essas duas premissas que sustentam o fenômeno jurídico da incidência da norma sobre o mundo fático, não pode estar submersa ao misticismo do plano das ideias, ou seja, para o professor Paulo de Barros Carvalho, a doutrina clássica[5] incorreu no erro de se pensar a incidência como algo que surgiria somente pelo nascimento de uma situação fática que estaria de acordo com o plano das ideias jurídicas. Ora, esclarece o professor, para que a incidência se dê, será necessário a confluência entre o reconhecimento pela autoridade competente, dentro do sistema jurídico, juntamente com o procedimento adequado: será o acontecimento jurídico indissociável da realidade jurídica, pois enquanto não produzida a linguagem com o timbre jurídico não há como garantir que tenha havido a incidência da norma, pois a juridicidade do fato só ocorrerá quando for produzido expediente necessário para documentar o seu nascimento, e, portanto, será através dessas condições que ganhará forma a regra matriz de incidência:

“Ora, a regra-matriz de incidência tributária é, por excelência, u’a norma de conduta, vertida imediatamente para disciplinar a relação do Estado com seus súditos, tendo em vista contribuições pecuniárias. Concretizando-se os fatos descritos na hipótese, deve-ser a consequência, e esta, por sua vez, prescreve uma obrigação patrimonial. Nela, encontra- remos uma pessoa (sujeito passivo) obrigada a cumprir uma prestação em dinheiro. Eis o dever-ser modalizado.”[6]

A rigor, a regra matriz de incidência enlaça o fato cujo qual não pertence à realidade fática, mas à realidade jurídica cunhada pelo Estado de Direito no alvorecer da república; diante da realidade jurídica, o fato, construído pela linguagem posta através da prescrição do direito positivo, será devidamente avaliado pela hipótese para a aferição de todos os critérios, nela, demandados. Nesse sentido, uma obrigação tributária nasce quando há a previsão abstrata posta na lei associada a um fato jurídico, que documentado pela produção dos expedientes que criam a realidade jurídica, já foram praticados no tempo e no espaço.

É mediante análise que surge a equação discriminada abaixo:

Enunciando: a hipótese tributária está para o fato jurídico tributário assim como a consequência tributária está para a relação jurídica tributária. Os antecedentes da proporção figuram no mesmo plano — o plano normativo geral e abstrato; por outro lado, os consequentes da proporção aritmética — fato jurídico e relação jurídica tributária também se acham no mesmo plano — o plano que fala do mundo material dos objetos físi- cos e dos seres humanos.[7]

Em suma, qualquer fato social que estiver na esfera jurídica, não possui o condão naturalístico da realidade fática, contudo é uma construção determinada pela realidade jurídica fundada em valores culturalmente estabelecidos pela história, e, portanto, será apreciado conforme a lógica do sistema, sendo, a norma, o holofote que iluminara a casuística em prol da coerência com a consciência que o indivíduo possui das formas mantenedoras da boa operação do direito em função da preservação das bases civilizacionais.



[1] Segundo o tributarista Kiyoshi Harada, se pressupõe receita o “ingresso de dinheiro aos cofres do Estado para atendimento de suas finalidades”. HARADA, kiyoshi. Direito financeiro e tributário. 26ª Edição. Editora Atlas. São Paulo. 2017. Pag. 41.
[2] Conforme ensina o doutor Edvaldo Pereira de Brito a despesa pode ser caracterizada como sendo os “gastos, os recursos aplicados, que o Poder Público faz de acordo com uma certa solenidade, de acordo com uma certa formalidade, de acordo com um certo critério”. Atividade financeira do Estado. Edvaldo Pereira de Brito. GANDRA, Ives Gandra Martins. MENDES, Gilmar Ferreira, NASCIMENTO, Carlos Valder do (coord.). Tratado de direito financeiro, volume 1. 1ª Edição. Editora Saraiva. 2013. Pág. 78
[3] Nas palavras de Paulo de Barros Carvalho, em entrevista dada ao site Conjur, disponibilizado pelo link. http://www.conjur.com.br/2009-out-21/livro-aberto-livros-vida-tributarista-paulo-barros-carvalho: “Ele criou o atual Sistema Tributário Brasileiro do nada, foi o principal coautor do projeto, e o sistematizador do Direito Tributário no país
[4] SOUSA, Rubens Gomes de. Compêndio de legislação tributária. Edição póstuma. São Paulo. Editora Resenha Tributária Ltda, 1975. Pág. 65.
[5] A doutrina clássica possui como o seu maior expoente, o ilustre jurista alagoano Pontes de Miranda.
[6] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 28ª edição. Editora Saraiva. 2017. Pag. 355.
[7] Ibidem. Pág. 274.